Recentemente cedi a uma obrigação moral no meio dos aficionados musicais: ouvir todos os discos lançados pelos Beatles. Já passou da hora, confesso, mas estou me redimindo aos poucos e está sendo uma grata experiência, claro.
Comecei, obviamente, pelo começo. Os cinco
primeiros álbuns dos Fab Four, aqueles que consolidaram os jovens como a mais
nova febre na década de 1960. Eu, que sempre fiz careta à menção de “iê iê iê”
e “Beatlemania”, fui surpreendido pela alta qualidade dos registros. Todos, em
maior ou menor grau, são exemplos de música pop feita com qualidade e
competência. Desde o debut Please Please Me até Help! fica latente o
talento acima da média de John, Paul, George e Ringo.
Mas eu sabia que os Beatles se tornaram o
que foram e o que são por causa do restante de sua discografia. E, no fim das
contas, ouvir sobre as mesmas temáticas bobas estava ficando chato. Então, aportei em Rubber Soul já de sobreaviso e vi uma outra banda no horizonte. Uma banda
aliando a absurda sensibilidade pop dos primeiros anos com algumas
experimentações e um leque cada vez maior de pensamentos e influências. Os
Beatles finalmente cresceram.
Depois de navegar por essas águas
cristalinas durante algum tempo, era hora de ir para o porto seguinte. Revolver,
1966. O ano da última turnê do quarteto, pré-Summer of Love. Capa p&b com os quatro rostos desenhados à mão
e diversas colagens ao redor. 14 faixas, como sempre, mas o detalhe de ter sido
gravado com calma, assim como seu antecessor, sem a agenda lotada de antes.
Terminada a viagem, declarei: uma
obra-prima.
Revolver é tudo o que uma banda de rock’n’roll
sessentista queria fazer, em termos de som, composição e produção. É pop rock
perfeito, sem tirar nem pôr, impecavelmente tocado e gravado. E, acima de tudo,
é... sutil.
A sutileza de Revolver foi o que me
deixou mais boquiaberto. Até mesmo as faixas mais diretas – Taxman, She said
she said, And your bird can sing... – são tocadas com cautela para que nada
soe fora do lugar. Momentos como Eleanor Rigby, Love you to e Here, there
and everywhere, então, são nada menos que sublimes. E os vocais tem uma grande
parcela nisso.
Os vocais são o grande destaque do disco,
especialmente na citada acima Here, there and everywhere e na lisérgica
estação final Tomorrow never knows. A primeira é cantada por Paul e o
atestado de que eu precisava para admitir de vez que ele era o melhor vocalista
dos Beatles. Logo atrás, George, mostrando na mágica Love you to seu talento
absurdo longe dos colegas de banda mais famosos, só com Ringo na percussão. E tocando cítara.
Ainda há a relaxada I’m only sleeping, a
pérola psicodélica Yellow submarine, a ensolarada Good day sunshine, a
pungente For no one, a linda I want to tell you e a festeira Got to get
you into my life. Todas impecavelmente compostas, cantadas, tocadas, produzidas,
enfim...
Todas em menos de 35 minutos. Menos é mais.
Dê play e abra um sorriso no rosto: