quarta-feira, 29 de julho de 2015

Stones + Ácidos lisérgicos + Festas rave = Screamadelica!



Lembro-me bem de como foi a sensação de ouvir Screamadelica, terceiro disco do Primal Scream. Estava eu folhando 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, um maravilhoso guia musical organizado por Robert Dimery, quando de repente algo me chamou a atenção. Uma capa extremamente icônica contendo um sol pintado a mão num estilo bem infantil saltou na direção dos meus olhos, causando-me uma curiosidade imensa de descobrir o que era aquilo. Deixando tudo ainda mais misterioso, não havia nada escrito nesta capa - algo que eu sempre adorei - e o disco se chamava Screamadelica, nome que parece definir algum estilo de música. Após toda essa cerimônia, consegui uma cópia do álbum com um amigo - que também conheceu o disco por sua capa -  e fui logo ouvir . O choque foi  grande.

Nos primeiros e icônicos acordes de violão de "Movin' On Up", tive a sensação de estar ouvindo qualquer disco lançado pelos Rolling Stones nos anos 70. Logo pensei que seria um disco vintage em pleno ano de 1991, e isso me animou. Porém, minhas expectativas foram frustadas. E tenho certeza que foi a melhor frustração que eu já ouvi na minha vida! Se 2001: Uma Odisseia No Espaço possui o maior corte da história do cinema, Scremadelica possui o maior corte da história da música. Do típico rock stoniano de abertura, o disco dá uma guinada extremamente radical em "Slip Inside This House". Samples, batidas eletrônicas, e muitos, mas muitos sons psicodélicos marcam esta guinada, e também todas as canções seguintes. E a cada canção que passava, o disco só crescia, vide as sensacionais "Don't Fight It, Feel It" (com seu marcante "som de grilo"), "Higher Than The Sun" e "Inner Flight".



Quando disco chegou na sexta faixa, ficou evidente que não era um álbum eletrônico convencional. "Come Together" é provavelmente o som gospel não-gospel mais ácido de todos os tempos, uma verdadeira "viagem" de dez minutos baseada em um órgão de igreja hipnotizante. Seria praticamente impossível superar esta canção, e o disco ainda estava na metade. Porém, o impossível, aconteceu. "Loaded" caiu como uma bomba, um tour de force carregado de metais, slide guitars, e uma linha melódica que remete o ouvinte direto para algum show apoteótico feito pelos Stones no passado. Sem dúvidas é o marco definitivo da junção de música eletrônica com rock and roll. O disco segue com "Damaged", pisando no freio quanto à psicodelia (trata-se de uma típica balada stoniana), mas logo retoma o clima clubber nas três faixas finais: "I'm Coming Down", a sublime "Higher Than The Sun - A Dub Symphony In Two Parts" e "Shine Like Stars".



O Primal Scream começou como uma banda de rock independente, praticamente desconhecida entre público e crítica, e com dois discos na bagagem. Em contrapartida, a sempre promissora Inglaterra estava dando sinais de uma nova cena underground que pouco se relacionava com o tradicional rock britânico. Era a cena clubber: festas guiadas por grupos de música eletrônica lisérgicos e regadas a psicotrópicos. Os grandes expoentes dessa cena eram o Stone Roses e o Happy Mondays. O Primal Scream não fazia parte desse mundo.

Foi a partir da metamorfose de "I'm Loosing More Than I'll Ever Have" - canção do repertório antigo do Primal Scream - em "Loaded" pelo DJ Andrew Weatherall que a mente criativa por trás da banda, Bobby Gillespie, teve a genial ideia de fazer um disco de acid house temperado com rock vintage. O resultado foi Screamadelica, um marco sem paralelos na história da música, que levou o house e a cultura clubber para todos os cantos do globo e mostrou que era possível fazer um som dançante e extremamente artístico ao mesmo tempo.


A redenção de Iggy


Depois da implosão dos Stooges em 1974, Iggy Pop era um legítimo “sem-futuro”. Os diversos vícios do frontman atingiam tal ápice que o transformaram numa figura folclórica decadente do submundo nova-iorquino. Diante desse quadro deplorável, Iggy se internou no instituto neuropsiquiátrico da Universidade da Califórnia e lá encontrou seu salvador: David Bowie.

Bowie foi um dos poucos a visitá-lo e apoiá-lo nesse período obscuro. Não é exagero dizer que, sem o superstar, Iggy dificilmente continuaria a carreira. A dupla retomou sua parceria se mudando para a porção oeste de Berlim em 1976. Na capital alemã, com a ajuda de Bowie e banda, Pop concebeu seus dois primeiros discos solo, aqueles que o redimiram dos excessos do passado e mostraram que ele ainda podia produzir algo de relevante.

O primeiro produto da estadia na Alemanha foi “The Idiot”. Por ter sido composto às vésperas das colaborações entre Bowie e Brian Eno – que originaram a Trilogia de Berlim –, o disco tem muito do que o inglês faria posteriormente: clima introspectivo e sintetizadores. Logo, o debut de Iggy é extremamente diferente da selvageria dos Stooges, soando frio, calculado, robótico. A influência que este exerceu em nomes como Depeche Mode e Nine Inch Nails é perceptível.

“Sister Midnight” e “China Girl” foram as escolhidas como single. A primeira é uma espécie de blues sem suingue com vocalizações graves, enquanto a segunda soa mais convencional devido à guitarra nervosa de Carlos Alomar e à interpretação inspirada de Pop. Um dos maiores méritos de “The Idiot”, inclusive, foi mostrar a versatilidade do vocalista fora da gritaria chapada dos Stooges. Isso fica ainda mais claro em “Nightclubbing”, que, junto de “Funtime”, parece a trilha sonora de uma pista de dança de uma boate obscura. Liricamente, merecem nota “Mass Production” (Though I try to die / You put me back on the line) e “Dum Dum Boys”, óbvia referência aos antigos companheiros de Iggy.  


Bastou “The Idiot” ser lançado e promovido para que Bowie e Pop voltassem ao estúdio. “Lust For Life” foi composto, gravado e mixado em oito dias, e isso teve reflexo no resultado final. Se por um lado o álbum é mais cru, mais rock’n’roll e, consequentemente, mais Iggy, por outro não é consistente como seu antecessor. Ainda assim tem seus momentos, como a faixa título e “The Passenger”, os dois maiores hits da carreira de Pop, e a divertida “Some Weird Sin”.



Os dois registros foram bem recebidos, especialmente “Lust For Life”, seu maior sucesso comercial. Mas a importância de ambos está no fato de terem sido a ressurreição de um dos maiores frontmen da história do rock’n’roll. É por causa deles que Iggy se manteve e se mantém respeitado e vivo, mesmo que nunca tenha gravado algo comparável à santíssima trindade dos Stooges. E nem precisa.

terça-feira, 28 de julho de 2015

O dia em que o Oasis tomou Wembley

15 anos de Familiar to Millions, um disco que capta a grandeza do Oasis e de suas canções num show memorável no “Maracanã” inglês.


Apesar de todas as controvérsias, declarações polêmicas e brigas entre os irmãos  Gallagher, o Oasis até o seu fim em 2009, se manteve como uma das maiores bandas da história do frutífero rock inglês, sempre tendo sucessos comerciais a cada lançamento . Mesmo que o Oasis lançasse álbuns que a crítica “torcesse o nariz”, uma coisa seria certa: Sempre haveriam hits radiofônicos que fariam muito sucesso  na mídia em geral e agradariam  os fãs, de forma que nenhum crítico poderia estragar a grandeza dessas canções. Esse foi o caso do quarto álbum do Oasis, o Standing on the Shoulder of Giants (2000), que marcou a passagem da banda do seu clássico som britpop dos anos 90 para novas sonoridades, como a psicodelia de “Who Feels Love” e o rock progressivo de “Gas Panic!”.  Apesar de não ter sido tão bem recebido, o álbum teve grandes hits como “Go let it Out”.

Da turnê deste álbum é que vêm o único disco ao vivo lançado pela banda, o memorável Familiar to Millions (2000), que conta com tanto hits da era britpop quanto com músicas do álbum da turnê. Foram duas noites no antigo Wembley Stadium, 21 e 22 de Julho, com cada uma tendo cerca de 70.000 mil pessoas de público, sendo que apenas o dia 21 foi documentado no disco. O show, sem dúvida, é uma belíssima exposição de rock de arena, pois além de conter grandes sucessos dos anos 90, como “Supersonic” e “Cigarettes and Alcohol”, conta também com a partcipação contagiante de uma platéia embebedada pelo som de hits homéricos como “Don’t Look Back in Anger” e “Wonderwall”, que na medida do possível, faz o espectador do DVD se sentir em Londres.

Fizeram 15 anos deste show em 21 de julho deste ano, e mesmo após tanto tempo, o disco se mantém firme como um fiel documento de uma virtude importante e distinta do Oasis: ser uma grande banda de rock de arena sem precisar de espetáculos pirotécnicos, luzes exageradas, bonecos gigantes ou qualquer outra coisa do gênero. Não que isso seja um defeito, pois às vezes tais artimanhas são eficientes e interessantes em shows como o do AC/DC, mas outras vezes, elas beiram o marasmo e tiram o foco do que é mais importante para um artista: grandes interpretações de grandes músicas. Isso o Oasis fez muito bem, prova disso é a grandiloqüência de Familiar to Millions. A sequência final do disco não deixa dúvidas da potência do Oasis ao vivo: “Live Forever”, uma das melhores letras escritas por Noel Gallagher, “Champagne Supernova”, a balada mais chiclete do Oasis e a indescritível explosão de guitarras distorcidas e melódicas de “Rock’ n’ Roll Star”, todas tocadas de modo mais impressionante e emocionante do que no disco. Com certeza, o disco explora um retrato ao vivo genuíno de uma das maiores bandas da história do rock. 


terça-feira, 21 de julho de 2015

Flipper - Album -- Generic Flipper (1982)


No início da década de 1980, o underground norteamericano fervia com o crescente surgimento de bandas cujo principal objetivo era tocar o mais rápido possível. Em Los Angeles, provavelmente o polo mais expressivo do chamado hardcore punk, havia o Black Flag, o Circle Jerks, o Adolescents, o Suicidal Tendencies. Em Washington, D.C. havia o Minor Threat, o Bad Brains. Em San Francisco, o Dead Kennedys... e o Flipper.

O Flipper apareceu ainda em 1979, contando com integrantes de outras bandas da região. Poderia ser apenas mais um bando de desocupados fazendo barulho, mas Bruce Loose, Will Shatter, Ted Falconi e Steve DePace tinham um diferencial: eles tocavam devagar. Ler isso em 2015 é uma banalidade sem tamanho, mas a cena hardcore oitentista levou muito a sério. Logo, o Flipper se tornou atração local, enfurecendo alguns, fascinando outros e, sobretudo, despertando a curiosidade de todos.

Lançado em 1982, “Album – Generic Flipper” é o icônico debut da banda e ultrapassou seu gênero influenciando Melvins, Eyehategod e outros expoentes do sludge metal. Isso porque todas as faixas do registro trazem consigo um clima carregado e barulhento, característica muito explorada nessa vertente do metal. Não se engane, contudo: a irreverência do Flipper faz com que o niilismo de suas letras se converta em pura raiva adolescente.

O que faz de “Album – Generic Flipper” um registro ainda importante, além de sua influência em outros estilos, é sua sinceridade. São 40 minutos de barulho descompromissado onde baixo e vocal – ambos alternados entre Bruce Loose e Will Shatter – servem de fio condutor, a guitarra simplesmente incrementa o caos sonoro com muita distorção e dissonância, e a bateria tenta acompanhar tudo isso da maneira mais básica possível. De “Ever”, a abertura, a “Sex Bomb”, um dos maiores hits do underground mundial, é essa a fórmula usada.

E o Flipper segue, aos trancos e barrancos, agora com Krist Novoselic no baixo. Sua estreia em disco continua aclamada nos circuitos alternativos e é um momento marcado na linha do tempo do punk rock por ser a primeira vez que uma banda aliou todo o peso do Black Sabbath à simplicidade do do it yourself. 

Ouça Flipper e monte uma banda.

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Se vira nos 30: O primeiro disco do Pink Floyd sem Syd Barrett



Junho de 1968. Após um considerável sucesso no meio underground com The Piper At The Gates Of Dawn, o Pink Floyd - banda da casa no UFO Club, em Londres - lança seu segundo LP. Logo nos primeiros segundos de "Let There Be More Light" já é possível notar que algo havia mudado. A Saucerful Of Secrets não tem a cor e o brilho pop de seu antecessor. Tudo é mais sombrio. A causa de tal sonoridade está no gênio criador de The Piper At The Gates Of Dawn, o brilhante Syd Barrett. Syd foi o responsável por oito das onze canções de Piper, sendo todas elas pérolas pop. Nenhum músico da época escrevia músicas psicodélicas melhor que Barrett. Porém, a crença de que o LSD poderia libertar seu corpo e mente da selvageria mundana causou um abalo sísmico na vida do jovem gênio, comprometendo seus compromissos com a banda. Shows irregulares, sumiços e desconexão com o mundo real eram elementos constantes na vida de Syd. Sua participação em A Saucerful Of Secrets é mínima: guitarra em "Set The Controls For The Heart Of The Sun" e "Remember A Day", nenhuma delas de sua autoria. Apenas a sublime "Jugband Blues", um folk-fanfarra surreal, era assinada por Syd.

O Pink Floyd como quinteto: David Gilmour no centro

Para preencher a lacuna deixada por Syd Barrett, o Pink Floyd recorreu a um velho amigo da banda, David Gilmour, que inclusive participou da gravação de A Saucerful Of Secrets. Quando o disco finalmente foi lançado, Barrett já estava fora do grupo, totalmente impossibilitado de exercer sua arte. Em 1969, é lançado Music From The Film More, que, apesar de ser um disco de estúdio, não era legitimamente uma criação do Pink Floyd, pois se trata de uma trilha sonora para o filme lado B More. Mesmo sendo um disco interessante, cheio de canções folky e até mesmo um proto-metal (ouça "The Nile Song"), tinha temáticas ligadas ao filme, limitando o foco criativo. A liberdade viria depois, em Ummagumma.

Ummagumma foi lançado também em 1969, e é o primeiro LP duplo do Pink Floyd, sendo o disco um gravado ao vivo e o disco dois no estúdio. A respeito do álbum ao vivo, há pouco que se falar.  Foi gravado no Mothers Club, em Birmingham, e no Manchester College of Commerce, e é livre de overdubs. Trata-se também do único registro ao vivo oficial da formação "clássica" da banda que tenha sido lançado na mesma época de sua gravação. Se Ummagumma fosse composto apenas desses dois primeiros lados, seria lembrado como um dos grandes discos ao vivo de todos os tempos, visto que nele estão contidas as versões definitivas de "Astronomy Dominne" - onde a guitarra de Gilmour começa a dar sinais de seu som clássico - , "Careful With That Axe, Eugene", "Set The Controls For The Heart Of The Sun" e "A Saucerful Of Secrets" - esta última apenas não supera a versão contida no filme Live In Pompeii, que infelizmente só existe em bootlegs.

Pink Floyd e seu equipamento: capa do disco ao vivo de Ummagumma para a reedição em CD

Porém, lançar apenas um disco ao vivo (repleto de "sucessos" do passado) logo após uma trilha sonora não ajuda a consolidar uma banda ainda restrita ao nicho do underground londrino. Era preciso algo novo. E é desta necessidade que surge a parte em estúdio de Ummagumma, o primeiro trabalho da formação Gilmour-Waters-Wright-Mason feito a partir do zero e sem a força criativa de Syd Barrett. Isso gerou uma imensa expectativa do que poderia resultar esta nova empreitada. Mais do space-rock criado por Waters em A Saucerful Of Secrets? Mais influência folk? Nem um, nem outro. Os dois lados do LP foram igualmente divididos entre os quatros músicos para serem usados como quiserem. A única unidade musical nisso tudo era um experimentalismo em níveis extremos e uso massivo de equipamentos de estúdio. O resultado: um disco sem paralelos.

Rick Wright tinha uma enorme bagagem de música erudita consigo, e contribuiu em Ummagumma com "Sysyphus", uma belíssima e pertubadora suíte de piano dividida em quatro partes, repleta de atmosferas dark. É sem dúvidas a melhor mais complexa contribuição entre os quatro. A sequência de Roger Waters seria previsível, afinal ele foi responsável por quase todo o disco A Saucerful Of Secrets, que carregava uma sonoridade bastante atmosférica e cheia de improvisos. Ledo engano. Waters da início a sua fatia com "Grantchester Meadows" (da qual o nome vem de um bosque que ele Barrett frequentavam na adolescência), uma joia folk preciosíssima acompanhada de sons de insetos, garantindo um maravilhoso clima bucólico. Mas não está tão distante musicalmente de "Cirrus Minor" - de Music From The Film More - , por exemplo. A verdadeira surpresa, em todo o disco, ficou por conta de "Several Species Of Small Furry Animals Gathered Together In A Cave And Grooving With A Pict". Apenas pelo nome é possível verificar que esta não seria uma canção normal. E realmente não é. Trata-se de uma das músicas mais bizarras da história da civilização ocidental, e também uma das mais divertidas! Waters usa apenas alguns microfones, aprimorados com equipamentos de estúdio, para simular sons de animais roedores, e mais nada. No final é possível ouvir Roger falando algumas frases soltas com um exagerado sotaque escocês.

Após esta dose absurda de avant-garde contida no lado A, vamos à metade final. David Gilmour e Nick Mason, ao contrário de Waters e Wright, nunca haviam escrito nenhuma canção sozinhos para o Pink Floyd. Gilmour foi o primeiro dos dois a dar as caras no lado B de Ummagumma com a breve suíte "The Narrow Way", em três partes. É uma peça bastante confusa, com momentos interessantes nas partes um e dois, ambas dedilhados de guitarra e violão preenchidos com sons eletrônicos. A parte três muito se assemelha com algumas canções de More, porém já traçando alguns esboços da sonoridade de Atom Heart Mother. Ela e "Grantchester Meadows" são as únicas faixas a contarem com vocais. Nick Mason encerra o disco com "The Grand Vizier's Garden Party", um solo de bateria experimental sem pé nem cabeça baseado em loops e técnicas de estúdio.

Ummagumma teve um considerável sucesso, alcançando o quinto lugar das paradas britânicas. Muito disso se deve ao impecável disco ao vivo. Quanto ao disco de estúdio, acabou caindo no ostracismo. Com o passar dos anos, a banda passou a renegá-lo friamente, classificando-o como um "experimento fracassado", um "erro". Muitos fãs sequer ouviram. Não é um disco fácil, afinal é extremamente avant-gard. Porém reflete muito bem o que o Pink Floyd fazia naquela época, principalmente nos palcos: um laboratório de experiencias sonoras, usado para aproveitar ao máximo todo o equipamento e tecnologia disponíveis. A experiência adquirida em Ummagumma foi crucial para que o Pink Floyd tomasse conhecimento de seu arsenal, e poder usá-lo para compor peças musicais simplesmente inacreditáveis. Vide Meddle, The Dark Side Of The Moon e Wish You Were Here. Sua audição atenta é extremamente recomendável, e garanto, será inesquecível.


Godspeed You! Black Emperor - 'Sweet, Asunder and Other Distress' (2015)


Em novo disco de inéditas, o octeto canadense reafirma sua peculiaridade 

Os anos 90 foram anos de renovação para a música. Muitas foram as manifestações artísticas desse período que trouxeram novos ares ao cenário e reverberam até hoje: o grunge, o britpop, o shoegaze... e o post-rock. As origens deste último vão do Velvet Underground e das bandas alemãs setentistas ao pós-punk experimental de gente como Public Image Ltd. e Gang of Four.  Pode parecer um rótulo um tanto quanto genérico – e, no fundo, é –, mas basta dar play no mais recente álbum do Godspeed You! Black Emperor, o maior expoente do subgênero, para constatar que há algo além do rock’n’roll no horizonte.

Formado em 1994 na província canadense de Quebec, o Godspeed You! Black Emperor mantém-se avesso a exposições midiáticas e, talvez por isso, se tornou um dos grupos mais cultuados da atualidade. Seu núcleo inicial contava com Efrim Menuck e Mike Moya, guitarristas, e Mauro Pezzente, baixista, mas ao longo dos anos expandiu-se até chegar à marca de oito membros. A música foi, desde sempre, instrumental. E diz muito.

‘Asunder, Sweet and Other Distress’ cessa um hiato de três anos sem material novo e matou a sede de muitos fãs. É o registro mais curto da carreira da banda, com pouco mais de 40 minutos, e suas quatro faixas tem como base a peça “Behemoth”, tocada ao vivo frequentemente desde 2012. A ordem em que foram dispostas facilita a divisão do álbum em dois momentos. O primeiro, épico e apoteótico, representado por “Peasantry or ‘Light! Inside of Light!’” e “Piss Crowns are Trebled”, primeira e quarta faixa; e o segundo, sombrio, representado por “Lambs’ Breath” e “Asunder, Sweet”, segunda e terceira faixa.


“Peasantry or ‘Light! Inside of Light!” traz consigo uma característica preponderante não apenas no Godspeed You! Black Emperor, como também em outros nomes do post-rock: a repetição. Os riffs de guitarra são repetidos por vários minutos criando uma atmosfera que, no caso desta e de “Piss Crowns are Trebled”, se transforma em pura grandiosidade. Porém, no miolo do disco o octeto renuncia às palhetadas e embarca em duas viagens estáticas guiadas por ruídos e nada mais. Recomendo fones de ouvido. 

Com ‘Asunder, Sweet...’ o Godspeed You! Black Emperor mostra a força da música instrumental em tempos tão pragmáticos quanto os nossos e diz muito mais do que diversos artistas por aí. Sem imagem pré-fabricada, sem promoção exagerada e sem o rock propriamente dito. Marcante e necessário.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Noel Gallagher's High Flying Birds - Chasing Yesterday (2015)


Em seu segundo álbum solo, Noel Gallagher faz um trabalho orquestradamente impecável

por José Victor

Após o fim do Oasis em 2009, o compositor e guitarrista, Noel Gallagher decidiu montar uma nova banda para apoiá-lo no palco e seguir carreira solo. O que de início parecia pretensioso, tornou-se algo maravilhosamente bom com o lançamento do primeiro álbum homônimo, Noel Gallagher’s High Flying Birds, lançado em Outubro de 2011, foi recebido muito bem pela crítica, visto que, recebeu  8 de 10 da NME e 4 de 5 estrelas da Q Magazine. Ademais, o álbum, que continha uma mistura perfeita de música pop, arranjos orquestrais e refrões de um rock muito grudento (como o próprio Oasis tivera outrora), foi recebido muito bem pelos fãs – numa enquete no site da Rolling Stone, cujo propósito era descobrir os 50 melhores discos de 2011, o primeiro álbum do ex-Oasis terminou em nono lugar.
                
Após a turnê do primeiro disco e 4 anos de espera, o segundo álbum do High Flying Birds, Chasing Yesterday, enfim, foi lançado em 25 de fevereiro deste ano.

Apesar de não ter sido tão bem recebido como seu antecessor pela crítica, ele não decepciona, e marca uma fase mais experimental na carreira de Noel Gallagher. Quase todas as músicas do álbum tem elementos bem diferentes daqueles usados com o Oasis ou do primeiro disco do High Flying Birds: "The Right Stuff",  tem falsetes bem afinados que levam a música a uma direção bem experimental;  "Riverman", é uma música potente e bem pop, que no seu interlúdio possui um saxofone bem do “tipo Pink Floyd”, algo que o próprio Gallagher não imaginava não permitiria nos tempos de Oasis - como revelou em uma entrevista recente a Rolling Stone; a balada lenta e emotiva “The Girl with X-Ray Eyes”, de início se parece até um pouco com “Stairway to Heaven” devido a progressão de acordes, mas depois se desenvolve numa canção que não caberia no primeiro disco do High Flying Birds e muito menos em um álbum do Oasis, sendo que o seu solo tem uma sonoridade muito peculiar- algo que parece ser uma genuína mistura de um tremolo com um phaser; The Mexican é uma  mistura interessante entre power chords pesados e sopros muito bem orquestrados.

Entretanto, Noel Gallagher ainda carrega suas raízes e experiências na bagagem.  Canções como “You Know We Can’t Go Back” e “Lock All The Doors” poderiam muito bem entrar em discos do Oasis, ambas possuem um instrumental mais puxado para o rock que consagrou o Oasis no anos 90 e 2000, inclusive, “Lock All The Doors” se assemelha muito com “Morning Glory”, sucesso do (What’s the Story) Moning Glory?, de 1995 do Oasis. “In the Heat of The Moment” com seu refrão estrondoso e uma letra digna do meu melhor compositor da era britpop, é o ápice pop do álbum, assemelhando-se um pouco com os hits do primeiro disco como “Everybody’s on the Run” e  “Dream On”.

Por fim, o disco termina com a odisseia lírica e grandiosa de pouco mais de 5 minutos  que é “The Ballad of Mighty I”, é algo que mesmo carregando uma sonoridade próxima de outro hit dançante do Noel Gallagher’s High Flying Birds(2011), “AKA What a Life” , ainda é uma música muito inovadora, fazendo justiça ao fechar um disco dessa magnitude. Sem dúvida, desde já esse disco é um dos melhores lançados neste ano, ao ouvi-lo é impossível não notar a habilidade que tem Gallagher de moldar a suas músicas de um modo pop, orquestrado e experimental ao mesmo tempo. Ainda que o Oasis não exista mais,  Gallagher e sua obra seguem “muito bem obrigado”.

Novos parceiros

É com grande satisfação que anuncio a entrada de dois companheiros neste humilde blog: Caio, o rei do prog, e José Victor, Oasis-maníaco e vocalista da About Sp. É noiz.