Uma estranha combinação
de diversos fatores fizeram deste o primeiro disco que podemos classificar como
“heavy metal”, mesmo que isso seja um anacronismo. O Black Sabbath era, basicamente,
uma banda de blues pesado - nos moldes do ascendente Led Zeppelin - praticamente
desconhecida. Quando entraram em estúdio para gravar seu álbum de estreia, não
tinham muito tempo nem dinheiro, forçando-os a fazerem poucos takes e gravando
tudo ao vivo. Isso é facilmente perceptível ao ouvir o álbum. Há uma sensação
de improviso durante todo o LP.
Mas este não era só
mais um disco de blues pesado.
O guitarrista Tony
Iommi, quando mais jovem, sofreu um acidente na metalúrgica em que trabalhava,
perdendo as pontas de dois dedos de sua mão direita. O que poderia ser uma
tragédia pessoal tornou-se um incentivo para continuar. Iommi fez dedais
caseiros para conseguir voltar a tocar, e, para ficar mais confortável,
afrouxou as cordas de sua guitarra. Isso deixava o som mais grave, denso e
pesado.
O baixista Geezer
Butler era um grande fã de histórias de terror e ocultismo, e era considerado o
“inteligente” da banda. Por isso escrevia as letras. Nessa época, todas elas
continham algum elemento dste universo.
O marketing feito pela
gravadora também foi importante, mesmo que sem o grupo aprovar, ou saber.
A sinistra capa, com uma foto feita em moinho qualquer, não tinha qualquer
relação direta com o Black Sabbath: nenhum dos integrantes sabia onde ficava
aquele lugar nem quem estava posando. Além disso, na capa interna, havia uma
cruz invertida com um texto estranho sobre um evento sombrio. Para completar, a
gravadora decidiu lançar o disco no dia 13 de fevereiro de 1970, uma sexta-feira
13.
Me lembro exatamente da
minha reação ao ouvir a música “Black Sabbath”, faixa que abre o disco. Devia ter
uns 12 anos, e já conhecia praticamente todas as músicas de Paranoid, o disco seguinte. Achava
aquilo tudo um som pesado, porém jamais “sombrio” ou “assustador”. Eis que fui
ouvir o tal “disco da bruxa”. Uma chuva. Trovões. Um sino de igreja. E, de
repente, o riff de guitarra mais tenebroso que ouvira até então vinha com força total. A música se acalma, mas o riff continua, deixando a coisa toda
parecendo um mantra. É aí que a voz agonizante (e totalmente diferente do que
se ouve em Paranoid) de Ozzy Osbourne
entra em cena. Ao gritar “Oh no!” o riff inicial voltava com força total. Eu
estava petrificado. Fechei o player de música do computador. No auge dos meus
12 anos aquilo me deixou extremamente perturbado. Alguns minutos depois, voltei
a ouvir o disco, porém pulando “Black Sabbath”.
“The Wizard” é uma
música fantástica. É a síntese de como se tocar um blues da maneira mais pesada
possível. A gaita combinada com a guitarra de Tony Iommi dá um clima
único para esta canção. Era a minha favorita na época. Na sequência temos a
dobradinha “Behind The Wall Of Sleep”/”N.I.B.”, uma verdadeira rifferama,
cortesia do mestre Iommi, com direito a um solo emblemático de baixo com wah de
Geezer Butler. Tão emblemático que é tocado até hoje nos shows do Sabbath, nota por nota.
“Evil Woman” é uma bela
cover do Crow, porém está no álbum apenas como exigência da gravadora, pois
seria o single que iria vender. Não vendeu, e a banda não curtiu a ideia. Mais
uma viradinha, desta vez com a soturna e macabra “Sleeping
Village” (um número acústico extremamente perturbador) e “The Warning”, guiada
pelo baixo forte de Geezer e contendo um solo imenso e magistral de Tony Iommi.
Este solo, inclusive, era muito mais extenso que a versão que está no disco. Foi
encurtado devido a uma exigência de quem? Isso mesmo, da gravadora. “Wicked
World” finaliza o álbum com um blues jazzístico, lembrando os primórdios do Earth.
Uns dois anos depois do
choque causado por “Black Sabbath”, resolvi ouvir novamente todo o álbum, incluindo a
faixa de abertura. Aí a coisa mudou. Não me senti perturbado e pude sacar a
música. “Black Sabbath” certamente é a canção mais pesada da história da música
popular, uma verdadeira missa negra, em todos os aspectos. Tem começo, meio, clímax e fim. Após as repetições do já citado
riff, a música toma um rumo acelerado que culmina em um final explosivo e
extremamente apoteótico. Quando acabei de ouvir a música pela primeira, fiquei
novamente petrificado, porém desta vez não por medo, mas sim por extremo êxtase.
É impossível não ficar chocado.