terça-feira, 29 de dezembro de 2015

O retorno do Blur aos estúdios: Um dos melhores momentos de 2015

                
Depois de mais de uma década sem lançar álbuns de estúdio, o Blur se sai muitíssimo bem numa mescla entre experimentalismo e sua sonoridade clássica dos anos 90.
                





The Magic Whip é um dos grandes álbuns desse ano. Sem dúvida, não poderíamos deixar que 2015 passasse em branco sem ao menos comentar sobre esse grande lançamento de um dos grupos do Britpop mais bem-sucedidos. Mas, o caminho até esse lançamento foi muito longo e cheio de desvios.
                Após o lançamento de Think Tank, em 2003, o Blur – que já estava desfalcado pelo guitarrista original, Graham Coxon – se separou. Em 2009, a banda se reuniu de novo para ser a headliner de uma das noites do britanicamente tradicional Glastonbury Festival – agora novamente com sua formação original, com Coxon retornando como guitarrista à banda. Desde então, o quarteto de Essex não se separou novamente, mas apenas vinha lançando algumas músicas inéditas (através de singles normalmente), discos ao vivo, coletâneas e fazendo shows mundo afora. Teríamos que esperar mais alguns anos após o retorno da banda para termos o gostinho fresco de um álbum novo de estúdio.
                Em 2013, depois do cancelamento do Tokyo Rocks Music Festival, no Japão, a banda se viu com alguns dias extras em Hong Kong e, como forma de se distrair, começaram a gravar novo material. Apesar do vocalista/letrista do Blur, Damon Albarn ter afirmado em Julho de 2014 de que o material trabalhado em Hong Kong seria “um daqueles discos que nunca seriam lançados”, Coxon mais Dave Rowntree e Alex James (baterista e baixista originais do Blur, respectivamente), junto do produtor Stephen Street (produtor dos discos clássicos do Blur dos anos 90, como Parklife, Great Escape e Modern Life is Rubbish), começaram a moldar o que viria ser The Magic Whip no final de 2014. Com os instrumentais prontos, Coxon apresentou as musicas reformadas à Albarn, que voltou a Hong Kong em Dezembro para ter inspiração para escrever as letras. Em Janeiro de 2015, os vocais estavam prontos e, em Fevereiro, a masterização também foi concluída.
                Em Abril de 2015, chegava às lojas físicas e online The Magic Whip, com uma capa exoticamente elegante, bela e simples, que homenageia a cidade que serviu de apoio para a concepção do album, Hong Kong. O material musical do disco, se comparado a capa, também não deixa a desejar. Do começo ao fim, o disco é feito de acertos, ou seja, 12 faixas equivalentes a 12 acertos. Primeiramente, porque o disco é completo, misturando o experimentalismo instrumental de 13 e Think Tank  à genialidade pop da era Britpop de Parklife. Exemplos disso são a curiosa “Ice Cream Man”, a belíssima “New World Towers” e a jazzística “Ghost Ship”, cujo um dos versos dá nome ao álbum. Em segundo lugar, a grandeza do disco se reflete também nos seus hits, os quais tem uma sonoridade tão peculiar do Blur dos anos 90 que poderiam estar em qualquer disco da era Britpop: a poderosa “Go Out”, cujo refrão pegajoso “to the lo-o-o-o-cal” gruda na cabeça facilmente, é um claro exemplo do resgate da sonoridade do britpop clássico do Blur; a primeira faixa do disco, “Lonesome Street”, que abre o album com um apelo pop genialmente construído sobre uma base instrumental sólida, sem “firulas”, com guitarra, baixo e bateria fazendo o simples e completo simultaneamente, relembra faixas memoráveis de Parklife como “Tracy Jacks” e “London Loves”. Todavia, o maior apelo pop do album fica por conta de “Ong Ong”, um pop de arena, cujo refrão “I wanna be with you” será facilmente cantado por milhares de pessoas ao mesmo tempo nos shows do Blur. Essas três ultimas músicas citadas, inclusive, são os maiores acertos de The Magic Whip , sendo assim, os pontos altos do disco, unindo qualidade musical e poética a qualidade comercial.

                 O resto do disco também não é material descartável, e sim um deleite aos apreciadores da banda e também àqueles que estão sendo iniciados ao som do grupo inglês de Essex. A volta do Blur ao estúdio tem que ser muito comemorada devido à qualidade e integridade do material lançado. A NME certamente fez muito bem em colocar The Magic Whip em 15° nos melhores álbuns de 2015, afinal, esse foi realmente um dos melhores – talvez até o melhor – lançamento de 2015.



quarta-feira, 11 de novembro de 2015

UMA MÚSICA DE CADA DISCO: Pearl Jam


Aproveitando que o Pearl Jam desembarca essa semana no Brasil para cinco shows (dia 11 em Porto Alegre, dia 14 em São Paulo, 17 em Brasília, 20 em Belo Horizonte e encerrando no Rio de Janeiro no dia 22) promovendo seu mais recente disco, Lightning Bolt, lançado em 2013, fiz esta matéria especial passando a limpo a discografia do grupo. Para isso escolhi aquela que julgo ser a canção mais representativa de cada disco. Menções honrosas inclusas!

“Black” – Ten, 1991





















Qualquer desavisado que for ouvir o disco de estreia do Pearl Jam sem saber do que se trata, provavelmente irá confundí-lo com uma coletânea de sucessos, tamanho o número de hits contidos ao longo de suas 11 faixas. E neste caso, foi impossível fugir do óbvio quando estamos falando de uma das mais belas canções de todos os tempos, que é “Black”. A enigmática letra escrita por Eddie Vedder, exclamada em uma performance impecável – principalmente na versão acústica gravada para a MTV – se tornou um hino da juventude dos anos 1990. Ouça também: “Oceans”, “Porch”, “Once” e “Alive”.


“Go” - Vs., 1993





















Uma verdadeira pancada que abre Vs., segundo disco lançado pelo Pearl Jam em 1993. O riff, tocado inicialmente no baixo e “engrossado” logo em seguida pelas guitarras de Stone Gossard e Mike McCready, é um dos mais pesados de todo o cardápio da banda, com um clima bastante escuro e até mesmo oriental (provavelmente uma influência stoniana de “Paint It Black”). É seguramente a abertura de disco mais impactante já feita pelo Pearl Jam, que aliás é especialista em fazer grandes aberturas de álbuns (alô, Stones novamente). Ouça também: “Elderly Woman Behind The Counter In A Small Town”, “Rearviewmirror”, “Daughter” e “Animal”.


“Spin The Black Circle” – Vitalogy, 1994

Confesso que foi extremamente difícil escolher apenas uma música deste que considero o melhor disco desta trinca inicial. Ao assumir o controle criativo, Eddie Vedder não poupou experiementalismos, tornando Vitalogy um álbum bastante diversificado. Fiquemos aqui com “Spin The Black Circle”, segunda faixa e provavelmente a mais punk já feita pela banda (ao lado de “Lukin”, é claro). Possui uma interessante letra pró-vinil (inclusive no encarte do CD está escrito “CD: Bad Acid ” ao lado da letra - risos). Ouça também: “Last Exit”, “Corduroy”, “Better Man” e “Not For You”.



“In My Tree” – No Code, 1996





















Se Vitalogy já causou um certo estranhamento entre os fãs mais ortodoxos, No Code foi o auge. Longe dos holofotes, o disco ficou mais restrito àqueles que se dedicavam a ouvir a fundo a discografia da banda. Porém, ao meu ver, é um disco essencial e extremamente maduro, tendo em vista que de meados dos anos 1990 em diante o rock mainstream foi ficando cada vez mais diluído e mastigado. Incluisive, para quem acompanha o trabalho da banda ao vivo, várias canções de No Code são presença obrigatória nos set-lists. “In My Tree” é uma das músicas que eu tenho maior carinho de toda a carreira do Pearl Jam, meio surf, meio psicodélica, meio Eddie Vedder – risos. Ouça também: “Sometimes”, “Hail, Hail”, “Red Mosquito” e “Present Tense”.


“Do The Evolution” – Yield, 1998





















Aqui não teve jeito. “Do The Evolution” é sem dúvida alguma minha canção favorita, não só de Yield, mas do catálogo inteiro do Pearl Jam. O clima “garageiro” combinado com uma produção crua encaixa  perfeitamente com a espetacular letra urrada por Vedder, vide os ácidos versos: "I can kill 'cause in God I trust, yeah/It's evolution, baby". Além disso, conta com um clipe sensacional, claramente influenciado pelo trabado de Gerald Scarfe no filme The Wall. Yield marca uma volta às origens, com a banda voltando a trabalhar em conjunto na composição das canções e traz uma sonoridade mais roqueira. É o disco predileto deste que vos fala. Ouça também: “Brain Of J.”, “MFC”, “Faithful” e “No Way”.


“Light Years” – Binaural, 2000





















Binaural é uma incógnita. Primeiro disco desde de Ten que não alcança o topo das paradas. Realmente, muito estranho, tendo em vista o grande sucesso que foi Yield. Até hoje o disco é praticamente esquecido entre até os mais radicais fãs. Provavelmente seja pela falta de hits potenciais, pois o álbum como um todo é bastante interessante, lembrando No Code em alguns momentos. O destaque fica por conta da belíssima “Light Years”, com um clima setentista maravilhoso. Claramente uma das mais lindas canções já feita pelo Pearl Jam. Ouça também: “God’s Dice”, “Nothing As It Seems”, “Soon Forget” e “Evacuation”.


“Love Boat Captain” – Riot Act, 2002


Uma das mais belas letras já escritas por Eddie Vedder, “Love Boat Captain” machuca. Ainda mais sabendo que seus versos "Lost nine friends we'll never know/Two years ago today" se referem a um acidente durante um show em Roskilde, que matou nove fãs. Extreamente existencialista, assim como todo o Riot Act, a canção se enqudra perfeitamente no contexto de perda, que permeia todo álbum. Além de contar com a melhor capa feita pela banda, Riot Act é dedicado à Dee Dee Ramone, John Entwistle e Ray Brown, todos baixistas falecidos em 2002. Ouça também: “Can’t Keep”, “Bu$hleaguer”, “Save You” e “Thumbing My Way”.


“Life Wasted” – Pearl Jam, 2006





















Após um hiato relativamente longo, o sol volta a brilhar para o quinteto de Seattle. O auto-intitulado é um sopro de vida, energia e despretensão – vide a magnífica e complexa capa. É de longe o álbum mais Rolling Stones feito pelo Pearl Jam, e dá início ao que eu chamo de “trilogia ensolarada” (até o fim do texto você entenderá o sentido desta expressão). A canção eleita como destaque é  a stoniana “Life Wasted”, faixa de abertura que relembra os tempos em que o Pearl Jam costumava iniciar seus discos no volume máximo. Ouça também: “World Wide Suicide”, “Comatose”, “Parachutes” e “Marker In The Sand”.


“Got Some” – Backspacer, 2009





















Parece que a formula do disco anterior deu certo, e o Pearl Jam voltou em 2009 com mais um excelente álbum, ainda mais alto astral e mais focado. Nenhuma grande inovação, mas com tudo em seu devido lugar e com direito até a um grande hit, a balada “Just Breathe”. Porém o destaque fica a cargo de “Got Some”, com sua vibe completamente californiana. Ouça também: “The Fixer”, “Just Breathe”, “Johnny Guitar” e “Gonna See My Friend”.


“Let The Records Play” – Lightning Bolt, 2013





















Finalmente chegamos ao último disco até o momento, o grande responsável pela atual turnê, Lightning Bolt. Terceiro da minha “trilogia”, o disco fez um sucesso estrondoso, com o hit baladesco “Sirens”. A música inclusive fez muito sucesso aqui em Terra Brasilis, tocando exaustivamente em diversos meios. Boa canção, mas passa longe das grandes faixas mais introspectivas do Pearl Jam. “Let The Records Play” é o grande destaque, um blues neilyoungano com uma letra próxima de “Spin The Black Circle”. Ouça também: "Getaway", "Mind Your Manners", "Pendulum" e "Lightning Bolt".


domingo, 11 de outubro de 2015

The perks of being a wallflower: uma ode à adolescência

Não subestime o mainstream.

Em 1999, Stephen Chbosky estreou na literatura com “The perks of being a wallflower”, um romance epistolar sobre o começo da adolescência e tudo o que vem junto dela. O sucesso foi estrondoso. Em 2012, o livro foi adaptado para o cinema com roteiro escrito pelo próprio Chbosky e astros juvenis como Logan Lerman (Percy Jackson), Emma Watson (Harry Potter) e Ezra Miller (We need to talk about Kevin) no elenco.

Em 2012, eu estava no último ano do Ensino Fundamental. Quando fiquei sabendo da mais nova febre entre meus colegas de classe, não pude ser mais cético. Um filme com a Hermione e o Percy Jackson chamado “As vantagens de ser invisível”? Perda de tempo.

Em 2014, eu estava no segundo ano do Ensino Médio, vivendo os conflitos – interiores e exteriores – diários e extremamente desgastado por isso. Foi aí que o livro chegou às minhas mãos. Li, ainda que um pouco receoso, e foi uma experiência inexplicável. Depois disso assisti ao filme por 4 ou 5 vezes.

Não subestime o mainstream.


“As vantagens de ser invisível” livro tem como protagonista Charlie, um adolescente solitário (daí o “wallflower”) com um histórico de problemas psicológicos às vésperas de ingressar no Ensino Médio. Sua jornada torna-se mais prazerosa quando ele conhece Sam e Patrick, dois veteranos “da ilha dos desajustados”. A partir daí, dá-lhe festas, drogas, música, brigas e reconciliações. A narrativa de Charlie é cativante por ser um mergulho profundo na mente de um adolescente lutando para lidar com os perrengues dessa fase da vida.

“As vantagens de ser invisível” filme tem uma relação interessante com o romance. Por Stephen Chbosky estar envolvido em ambos, inspiração e adaptação complementam-se muito bem. A inspiração é obviamente superior, mas o filme merece ser visto e revisto pelas passagens que diferem do romance, e vice-versa.

Um elemento essencial da trama é a música. A história se passa no início dos anos 1990, logo as mixtapes são uma constante e o rock alternativo está se apossando do seu trono de direito. Por isso, a trilha sonora da película é recheada de hinos hipsters (“Teenage Riot” do Sonic Youth, “Asleep” dos Smiths, “Pearly-dewdrops’ Drops” do Cocteau Twins) e alguns hits improváveis (“Tugboat” do Galaxie 500, “Low” do Cracker, “Dear God” do XTC), sem mencionar as incursões por décadas anteriores com “Come On Eileen” do Dexy’s Midnight Runners e “Heroes” do David Bowie. Uma coletânea digna de Charlie, sem dúvidas.

Recentemente reli o livro e as emoções foram as mesmas que senti na primeira leitura. Acredito que todo mundo que já foi adolescente alguma vez na vida se identificará com a sensibilidade aflorada, o sentimento de não-pertencimento, o sentimento de pertencer a algo, a rebeldia, o amor, enfim, a vida de Charlie.

E, nesse momento, seremos infinitos.

Obrigado, Stephen Chbosky, Emma Watson, Logan Lerman e Ezra Miller. Obrigado a quem me emprestou o livro no segundo ano, e obrigado à livraria em que pude comprá-lo e relê-lo para reviver uma das melhores experiências que já vivi. Quanto a quem não leu/assistiu, faça-o. Por favor.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Algumas boas músicas de 2015

VAI, PATTON!

Final de semestre, vestibular batendo na porta... Tempo livre é escasso. Logo, não ouvi todos os lançamentos que queria ter ouvido – como sempre – e muito provavelmente não ouvirei mais nenhum nesse quase fim de ano.

Mas isso não significa que não pude conferir o que anda sendo produzido de bom em 2015. Esse ano, a meu ver, foi bem satisfatório. O objetivo dessa lista é fazer um apanhado do que mais gostei resumido em músicas, meio que um best of de singles. Não tenho a pretensão de eleger melhores do ano ou algo do tipo, apenas relembrar e compartilhar o que agradou meus ouvidos

Obs.: em ordem alfabética.



Black AlienRock’n’roll (feat. Edi Rock)

O aguardado retorno de Black Alien ao estúdio após 11 anos com “Babylon by Gus Vol. II: O Ano do Macaco” foi aquém do esperado. Trouxe, contudo, algumas pedradas dignas da carreira do rapper carioca. Rock’n’roll é uma das mais destacáveis do novo trabalho, não só pela base pesada e letra pertinente, mas também por contar com o veterano Edi Rock, dos Racionais MCs, dividindo os microfones com Gustavo. O resultado é destruidor.



BjörkLionsong

A sempre peculiar Björk compôs “Vulnicura” como forma de se recuperar da instabilidade emocional que ela viveu após seu conturbado divórcio. O álbum possui uma sonoridade exótica cheia de nuances e experimentações, sendo a belíssima Lionsong um perfeito exemplar desses aspectos. Detalhe para as percussões e os instrumentos de cordas, ambos elementos frequentes no último disco da islandesa.


Faith No MoreMotherfucker

O sensacional show do Faith No More no Rock in Rio na última sexta-feira me obrigou a conferir o material dos caras. Comecei por “Sol Invictus”, e a experiência foi satisfatória. Escolhi Motherfucker por esta já ter se tornado a abertura definitiva das apresentações da turnê atual da banda e ser uma amostra bem dosada de toda a irreverência e competência de Mike Patton e companhia. Get the motherfucker on the phone!!!


GhostFrom The Pinnacle To The Pit

Nunca havia dado muita atenção aos suecos do Ghost; minha remissão foi a melhor possível. “Meliora” foi, sem dúvidas, a maior surpresa que tive esse ano.  Apesar de não ser a minha favorita do disco – o título vai para Mummy Dust –, From The Pinnacle To The Pit é um hard rock tão bom que não poderia ser deixado de fora. Retrô sem ser cópia da cópia, perfeito para ser entoado por estádios inteiros.


Luiza LianEscuta Zé

Luiza Lian é uma cantora paulista que surgiu na cena recentemente com seu disco homônimo. Acompanhada por uma banda que conta com Martim Bernardes e Guilherme D’Almeida (O Terno), entre outros, sua notável voz casa perfeitamente com o misto de passado e presente dos elegantes instrumentais. Escuta Zé, ácida e necessária, é o grande destaque.  



MotörheadElectricity

“Live fast, die young”, bradavam os punks mais inconsequentes. No caso de Lemmy Kilmister, o lema tem que ser adaptado para “live fast, die old”. O baixista, vocalista e dono de uma das maiores instituições do heavy metal mundial foi tão inconsequente quanto seus contemporâneos de calça rasgada e jaqueta de couro, e agora sofre as consequências. Mas o gosto pelo barulho não abandonou o inglês no alto dos seus 70 anos, felizmente. Electricity, faixa de "Bad Magic", é tudo o que o Motörhead sempre foi: direto, reto e pesado. E sensacional.


Napalm DeathMetaphorically Screw You

À semelhança do Motörhead, seus conterrâneos do Napalm Death tem uma longevidade invejável e, mais que isso, uma capacidade impressionante de reinvenção. Se a partir da década de 1990 eles abraçaram de vez a mescla de death metal com grindcore, no momento vem incrementando essa fórmula da melhor maneira possível. “Apex Predator – Easy Meat” prossegue com a barulheira profissional de “Utilitarian” (2012) e tem várias pérolas da porradaria, sendo Metaphorically Screw You uma das mais memoráveis.


St. VincentTeenage Talk

Impossível não mencionar a artista mais interessante dos últimos tempos. Depois do autointitulado do ano passado, Annie Clark embarcou em uma turnê extensa, inclusive tocando no Lollapalooza Brasil. Enquanto o álbum novo não chega, os fãs se contentam com Teenage Talk, uma balada nostálgica, minimalista e maravilhosa.



Viet Cong Continental Shelf

Coincidentemente, a última música dessa lista é a que eu mais ouvi ao longo desses meses. A fórmula é simples: pós-punk na escola do Joy Division e The Cure. Ou seja, produção cheia de ecos e delays, bateria tribal e clima sombrio. O Viet Cong estreou esse ano com um dos trabalhos mais expressivos de 2015 e ainda vai fazer muito barulho por aí. Por ora, Continental Shelf é uma das minhas músicas favoritas.  

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Valorizem o Royal Blood! - Palavras sobre o show no Rock In Rio 2015



A presença do grupo britânico Royal Blood nesta edição do Rock In Rio foi uma surpresa em vários aspectos. O primeiro deles é o anonimato quase unânime em relação à banda por parte da plateia que estava na Cidade do Rock no último dia 19. Este desconhecimento é claramente perceptível, levando-se em consideração que a imensa maioria do público estava lá para ver o Metallica, gigante mundial do metal, com décadas de experiência no show business. Salvo um ou outro fã do estreante grupo, ninguém ali sabia de que se tratava o tal Royal Blood.

Vendo pelo lado de Mike Kerr e Ben Thatcher (os únicos membros da banda), a tarefa de fazer o show nestas condições não era algo simples. Ter que apresentar algo novo aos fãs do Metallica que estavam no Rock In Rio não é fácil. As chances de ocorrer algo parecido com o Ghost, que foi vaiado na edição passada pelos fãs do mesmo Metallica, eram gigantescas. Porém não estamos falando de uma banda qualquer. Estamos falando dos caras do Royal Blood, e estes caras sabiam exatamente o que fazer.

A banda subiu ao palco com uma confiança surpreendente, tendo em vista a possível hostilidade do público e a estreia no festival. A partir daí, o surpreendente desfile sonoro começou. O Royal Blood conta com uma formação até então inédita para uma banda de rock: um duo de baixo e bateria. Mike Kerr usa amplificadores de guitarra e uma tonelada de pedais para extrair um som diferenciado. Apesar de muitas vezes soar como uma guitarra, claramente o que ouvimos é um baixo pesadíssimo capaz de criar riffs, solos, e até mesmo levadas rítmicas típicas de uma guitarra. Além desta inovação, temos ainda o monstruoso baterista Ben Thatcher, descendente direto de nomes como John Bonham e Ian Paice, visto seu estilo cru,  pesado e cheio de groove ao tocar bateria. Tudo isso causou uma boa surpresa na plateia, que não acreditava que aquela massa sonora era feita por apenas dois músicos.

Banda de dois: presença de palco impecável


O repertório, apesar de limitado ao seu único disco de estúdio, lançado no ano passado, também foi mais um ponto a favor do Royal Blood. Fazendo um casamento interessante entre Led Zeppelin e Queens Of The Stone Age, canções como "Ten Tonne Skeleton", "Figure It Out" e "Blood Hand" foram um belo e poderoso cartão de visitas para os até então novos ouvintes. Porém a apoteose foi "Out Of The Black", música que encerrou o espetáculo, toda repleta de jams, experimentações com equipamento, mosh do baterista Ben Thatcher e até uma inclusão do riff de "Iron Man", do Black Sabbath (jogada mestra para conquistar o público do metal a esta altura do show).

Após o fim da apresentação, foi possível ouvir o público gritando o nome banda, em um óbvio tom de aprovação. O único erro foi ter escalado o Royal Blood para este dia do festival. O ideal seria o dia 24, no qual dividiriam o palco com o já citado Queens Of The Stone Age e o System Of A Down. Se isto acontecesse, o show seria considerado histórico. Mas apenas pelo fato de terem agradado uma plateia impossível de se agradar, pode-se notar que algo aconteceu. Para o bem.

Setlist:

1 - Come On Over
2 - You Can Be So Cruel
3 - Figure It Out
4 - Better Strangers
5 - Little Monster
6 - Blood Hands
7 - One Trick Pony
8 - Ten Tonne Skeleton
9 - Loose Change
10 - Out Of The Black




segunda-feira, 7 de setembro de 2015

David Byrne e St. Vincent em Love This Giant: o gigante e a novata


David Byrne. Ícone da cultura pop, antigo líder do extinto Talking Heads, multi-instrumentista, radialista, pesquisador musical, excêntrico, inquieto. Um artista, no sentido mais literal do substantivo.
 
Annie Clark. Guitarrista de mão cheia, originária do Texas, completamente avessa aos estereótipos reacionários do estado sulista. Rosto relativamente novo, ela começou sua carreira sob o pseudônimo de St. Vincent em 2007 e desde então se estabeleceu como um dos nomes mais promissores do circuito alternativo. Uma artista, também.

Em 2009 os caminhos desses dois expoentes se cruzaram e o que era pra ser uma única apresentação ao vivo evoluiu para uma colaboração mais profunda. A partir daí, o veterano e a novata trocaram composições o suficiente para encher um disco. 

Love This Giant saiu em 2012 pela lendária 4AD e pela Todo Mundo, selo do próprio Byrne. A peculiar capa com os rostos deformados da dupla nos encarando nasceu do conceito de A Bela e a Fera ao contrário: David, a Fera, com uma covinha galante contrastando com os cabelos brancos; Annie, a Bela, com uma protuberância bizarra em suas feições delicadas. Nada inesperado em se tratando de duas pessoas fora do padrão.

Colaborações desse tipo precisam de algo a mais para não se assemelharem demais ao trabalho solo dos envolvidos. No caso de Love This Giant, isso foi prevenido com a adição de um time de metais à parafernália tecnológica utilizada brilhantemente pelos dois. O resultado: grooves tão deformados quanto as faces da capa.

Produzido por Clark e Byrne em conjunto com o renomado John Congleton (Swans, Franz Ferdinad, Sigur Rós, entre outros), o álbum destila uma deliciosa elegância em meio aos andamentos intrincados, em grande parte por causa do altíssimo nível dos metais. São doze faixas esquisitas e totalmente dançantes, reflexo da distinta sensibilidade pop de ambos.

Liricamente, Love This Giant aborda temas como a modernidade gerando alienação, relacionamentos destrutivos, a força da natureza e a fragilidade humana, todos comuns às obras de David e Annie. Nesse aspecto, destaca-se a empolgante “I Should Watch TV” e sua crítica ao papel de integração social atribuído quase em totalidade à mídia e a estéril massificação resultante disso.

A dupla excursionou durante 2012 e 2013 fazendo shows recheados de coreografias robóticas e versões de clássicos do Talking Heads e singles da St. Vincent. Depois cada um seguiu seu caminho levando os frutos colhidos: David foi capaz de renovar sua relevância e Annie absorveu novas influências para sua ascendente carreira. Vantajoso para eles e para nós.




quarta-feira, 29 de julho de 2015

Stones + Ácidos lisérgicos + Festas rave = Screamadelica!



Lembro-me bem de como foi a sensação de ouvir Screamadelica, terceiro disco do Primal Scream. Estava eu folhando 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, um maravilhoso guia musical organizado por Robert Dimery, quando de repente algo me chamou a atenção. Uma capa extremamente icônica contendo um sol pintado a mão num estilo bem infantil saltou na direção dos meus olhos, causando-me uma curiosidade imensa de descobrir o que era aquilo. Deixando tudo ainda mais misterioso, não havia nada escrito nesta capa - algo que eu sempre adorei - e o disco se chamava Screamadelica, nome que parece definir algum estilo de música. Após toda essa cerimônia, consegui uma cópia do álbum com um amigo - que também conheceu o disco por sua capa -  e fui logo ouvir . O choque foi  grande.

Nos primeiros e icônicos acordes de violão de "Movin' On Up", tive a sensação de estar ouvindo qualquer disco lançado pelos Rolling Stones nos anos 70. Logo pensei que seria um disco vintage em pleno ano de 1991, e isso me animou. Porém, minhas expectativas foram frustadas. E tenho certeza que foi a melhor frustração que eu já ouvi na minha vida! Se 2001: Uma Odisseia No Espaço possui o maior corte da história do cinema, Scremadelica possui o maior corte da história da música. Do típico rock stoniano de abertura, o disco dá uma guinada extremamente radical em "Slip Inside This House". Samples, batidas eletrônicas, e muitos, mas muitos sons psicodélicos marcam esta guinada, e também todas as canções seguintes. E a cada canção que passava, o disco só crescia, vide as sensacionais "Don't Fight It, Feel It" (com seu marcante "som de grilo"), "Higher Than The Sun" e "Inner Flight".



Quando disco chegou na sexta faixa, ficou evidente que não era um álbum eletrônico convencional. "Come Together" é provavelmente o som gospel não-gospel mais ácido de todos os tempos, uma verdadeira "viagem" de dez minutos baseada em um órgão de igreja hipnotizante. Seria praticamente impossível superar esta canção, e o disco ainda estava na metade. Porém, o impossível, aconteceu. "Loaded" caiu como uma bomba, um tour de force carregado de metais, slide guitars, e uma linha melódica que remete o ouvinte direto para algum show apoteótico feito pelos Stones no passado. Sem dúvidas é o marco definitivo da junção de música eletrônica com rock and roll. O disco segue com "Damaged", pisando no freio quanto à psicodelia (trata-se de uma típica balada stoniana), mas logo retoma o clima clubber nas três faixas finais: "I'm Coming Down", a sublime "Higher Than The Sun - A Dub Symphony In Two Parts" e "Shine Like Stars".



O Primal Scream começou como uma banda de rock independente, praticamente desconhecida entre público e crítica, e com dois discos na bagagem. Em contrapartida, a sempre promissora Inglaterra estava dando sinais de uma nova cena underground que pouco se relacionava com o tradicional rock britânico. Era a cena clubber: festas guiadas por grupos de música eletrônica lisérgicos e regadas a psicotrópicos. Os grandes expoentes dessa cena eram o Stone Roses e o Happy Mondays. O Primal Scream não fazia parte desse mundo.

Foi a partir da metamorfose de "I'm Loosing More Than I'll Ever Have" - canção do repertório antigo do Primal Scream - em "Loaded" pelo DJ Andrew Weatherall que a mente criativa por trás da banda, Bobby Gillespie, teve a genial ideia de fazer um disco de acid house temperado com rock vintage. O resultado foi Screamadelica, um marco sem paralelos na história da música, que levou o house e a cultura clubber para todos os cantos do globo e mostrou que era possível fazer um som dançante e extremamente artístico ao mesmo tempo.