O
sucesso é um fenômeno perigoso. Vem sem aviso, abala as estruturas dos
envolvidos e pode ir embora tão ou mais rápido quanto chegou. Na virada de 1990
para 1991, o Fugazi experimentou deste: a turnê de promoção de Repeater, uma
das estreias mais estrondosas da história da música, arrebanhou um séquito
monumental de fãs e não demorou a chamar a atenção dos engravatados.
Contrariando as expectativas o quarteto de Washington, DC manteve-se firme em
suas convicções e preferiu seguir na Dischord, que, apesar de pequena, era
território seguro e livre de cobranças mercadológicas.
Ainda
assim, havia toda uma espera muda e ansiosa no habitat natural dos rapazes. O
que estava por vir? superaria o aclamado debut? Em julho de 1991 a curiosidade
pode ser sanada na forma de Steady Diet of Nothing, um disco de nome estranho e
capa simples.
Se
a arte de Repeater ostentava o nome em letras garrafais, a de Steady Diet
sequer o fazia na parte da frente, que contava apenas com uma imagem simples e
um “Fugazi” no canto superior esquerdo. Julgar um livro pela capa não costuma
ser correto, mas nesse caso faz todo sentido. Basta dar play em “Exit Only”:
cacofonia despretensiosa abrindo alas para riffs simples, bateria cadenciada e
letra abstrata.
Suceder
um trabalho prestigiado é sempre tarefa árdua, e, no caso do Fugazi, foi
dificultada pela ausência de Ted Niceley, o produtor de Repeater. Ou seja, os
caras acabaram tendo que se virar com o pouco conhecimento que tinham do
assunto. Segundo Ian MacKaye, a mixagem foi especialmente complicada. Ninguém
queria afetar a performance do colega, assim, Steady Diet acabou sendo mixado,
em suas próprias palavras, “democraticamente”. Portanto, não há nada da
sonoridade grandiosa do debut.
Em
vez disso, a banda enveredou por caminhos mais minimalistas, com a dupla Joe
Lally (baixo) e Brendan Canty (bateria) se destacando muito mais que os riffs
esparsos de MacKaye e Guy Picciotto. Talvez por isso Steady Diet se tornou um
disco subestimado tanto pelos críticos quanto pelo próprio Fugazi. Mas eu digo
que ambos os lados foram injustos. Afinal, um disco com a paulada visceral de
“Reclamation”, o groove torto de “Stacks”, a bateria insana de “Latin Roots”, a
beleza de “Long Division”, a dissonância de “Dear Justice Letter”, a tensão de
“KYEO”, enfim, não pode ser desconsiderado. Essa capa desbotada esconde um
álbum violento, catártico, desesperado e engajado. E, por isso – e também por
ter sido meu primeiro disco de vinil lacrado –, tão bom ou até superior a
Repeater.
Para
terminar, a oportuna letra de “Reclamation”, uma das melhores músicas que já
ouvi:
These are our
demands –
We want control of
our bodies
Decisions will now
be ours
You’ll carry out
your noble actions
We will carry our
noble scars
No one here is
asking
But there is a
question of trust
You will do what
look good to you on paper
We will do what we
must
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